“No fim do mundo, nas terras brancas, frias, ignotas,
‘Vive um palácio muito bonito, com portas de ouro,
‘E um Rei que nunca na sua vida sofreu derrotas
‘E que tem gemas iguais à lua no seu tesouro…
Para se ir lá, sobem-se muitas, muitas montanhas,
‘Passam-se mares todos revoltos sob procelas,
‘Descem-se abismos em cujas negras, mudas entranhas
‘Dragões de fogo fazem perguntas, mostrando as goelas…
Anda-se muito, sofre-se muito… Mas é preciso,
‘Para chegar-se ao palácio lindo no fim do mundo,
‘Que a alma, ao contrário, seja um caminho liso, bem liso,
‘Como o céu claro, puro, bondoso, grande, profundo…
Quando se alcançam as terras brancas, frias, ignotas,
Sozinhas se abrem as portas de ouro, caladamente…
E o Rei que nunca na sua vida sofreu derrotas
‘Estende em taça cor das estrelas muito remotas
‘A água que apaga todas as dores da alma da gente…”
Cecília Meireles
In Acervo do memorial do Rio Grande do Sul, em Porto Alegre.