Em uma mesa retangular, com
conjunto de oito cadeiras, foi decidido uma viagem para praia. Imaginei eu que
seria maravilhoso como sempre. Nós costumávamos ir à praia, a única diferença
foi o combinado que ocorreu naquela reunião em família, para que minha mãe não
fumasse, o que achei, na época, que era um pedido muito severo, já que mamãe
gostava tanto de fumar.
Ela, por sua vez, disse que
preferia morrer a parar de fumar, eu a entendi, não na frase intensa por um
todo, mas meu bico ou chupeta sempre estava comigo; eu também gostava muito e
não largava por nada. Logo depois desse pronunciamento ríspido de minha mãe, meu
pai vomitou palavras sobre a mesa que chocaram todos, menos a mim.
– A mãe de vocês vai falecer!!!!! -
exclamou meu pai em alto e bom tom.
Observei tudo aquilo e não estava
entendendo absolutamente nada. Minha preocupação, para uma criança de seis anos
de idade, era apenas assistir meu desenho favorito na TV. Então, dito aquilo e com
o silêncio que isso gerou em seguida, eu então percebi claramente que já tinha
acabado a reunião em família e disse:
- Tá bom, vou para a sala assistir
desenho, tá?!
Permitiram que eu saísse da mesa, mas
ninguém me explicou o significado de falecer. Estava tudo bem certo, né? Era
apenas mais uma das tantas palavras difíceis que adultos falam.
A viagem à praia estava diferente,
minha mãe passou mal por todo o caminho. Ela amava aquela estrada, nunca passou
mal. O que estava acontecendo?
Finalmente chegamos e fomos para
casa da minha avó, mãe de minha mãe. A casa não estava com a felicidade que a
maresia carregava. Todos da família de minha mãe estavam lá; nos abraçaram
muito, mas tudo bem, né? Eles sempre foram muito carinhosos. Os dias passaram e
percebi que minha mãe encontrou um lugarzinho de aconchego debaixo do pé de
carambola que tinha no quintal. Todos os dias ela levava seu colchão, deitava e
ficava me observando. Eu, que não largava ela, ficava por lá brincando com umas
borboletinhas chamadas soldadinhos. Eram pequeninos, com asas pretas e bolinhas
brancas; eram belíssimos.
Estava tudo bem, certo, né? Errado,
completamente errado. Os dias se passaram e apareceram macas, galões de
oxigênio. Minha mãe, que antes tinha um cabelo na cintura, encaracolado, e uma
boa forma e felicidade constante, agora estava careca, sempre chorando, tossia
muito. Tossia tanto que chegava a vomitar. Lembro bem dela com a mão na testa,
completamente desesperada. Algo não estava certo.
Acordei na manhã seguinte com todos
desesperados, correndo de um lado para o outro. Eu fui até a varanda da frente
olhar o que estava acontecendo: tinha tubulação e fios que levavam até a rua e
minha mãe estava lá com uma máscara de oxigênio, do lado de um carro da cor
preta. Então decidi ir até ela.
Para não tropeçar nos fios e desligar
tudo, eu fui pulando por eles, um pulinho por vez. Quase chegando na porta,
passaram crianças correndo das quais não me recordo porque eu não tinha primos
da minha idade. Levaram com eles todos os fios e o oxigênio de minha mãe. Vi
com os olhos de uma garota aos seis anos, a pessoa que mais amei pedir por ar e
não encontrar. Eu corri eu corri muito pra chegar até ela, eu tentei abraçar,
tentaram me tirar. Ela olhou pra mim desesperada, querendo um abraço ou me
afastar para não ver o que aconteceria a seguir. Ela desmaiou.
Colocaram minha mãe no carro preto
que estava ao lado. Pedi para ir junto, mas nenhum adulto deixou. Eu só queria
minha mãe, eu queria saber se ela estava bem, queria saber se ela tinha
acordado.
Ela não acordaria mais.
Aquela palavra que eu desconhecia,
acabei de entender da forma mais dolorosa que um filho pode entender. Ela não
desmaiou, ela faleceu!
Moana Mairink Dutra de Souza
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