Na noite escura ouço o barulho das asas.
Vem o desejo de cantar à beira das águas
claras,
ver o reflexo das estrelas
e,
talvez, mergulhar entre elas
para um sonho sem sombras.
As asas da noite me levam tão alto
que os contornos do mundo se dissolvem
e a realidade é cada vez mais abstrata.
Voo além dos muros,
mais e mais longe,
passando pelo mar e molhando as pontas
das asas,
passando pelo céu e ganhando as cores da
íris,
passando pelo mundo e calando as vozes do
tempo.
Quando, envolvido pelo escuro céu, ouço o
barulho das asas,
(a realidade se estampa nas nuvens
cinzentas,
o silêncio toma conta da alma
e o destino se esquiva dos dedos,
para os êxtases sem acompanhante,
para os passos sem rastro,
para os corpos sem sombra)
já não sou mais aqui.
Sou longe, na paisagem sem cercas,
nem linhas,
nem desejos.
LOPES. Delvanir. Além dos muros. In: Fímbria, 2012.