domingo, 9 de março de 2014

Rota fortunae - Delvanir Lopes



Foi nos dias de verão
quando os delírios se tornaram mais intensos,
que no sol,
jardins irreais,
por onde passeei tantas horas,
iam, translúcidos,
sendo taciturnos desertos.

Foi nos dias de angústia,
quando as flechas,
torres secas,
sombras e céu sem nuvens,
- esse cemitério de sonhos -
iam gerando braços mortos,
enlaçados,
que um dia quis imortais.

Libertar,
fugir dos nós do jogo sem convite.
Esperar,
sem paciência, que o gelo derreta a loucura
que já domina meus dias.
Aceitar, chorando,
o novo lance do acaso.

São tantas despedidas
no verão do sofrimento
quando as almas se derretem
e atravessam os vitrais do tempo

para pousarem em jardins de vento
e serem só perfume...

que espero a primavera,
quando as sementes de cores
atrairão aves migratórias
para povoar esse jardim;
quando os ventos do poente
virão, mansamente,
girar, ainda uma vez,
a roda do meu destino.


LOPES, Delvanir. Rota Fortunae In: Jardim de concisos. Florianópolis: Bookess, 2015, p. 63-64.


domingo, 2 de março de 2014

MADRUGADO - Delvanir Lopes

Madrugado
 


 Cheguei antes do sol,
carregado de noite e de orvalho,
protegido no silêncio em meio às árvores
sem primavera.

O assovio de morte que atravessa os galhos,
secos e tortos,
respira próximo aos meus ouvidos,
sussura que não é o fim
e leva os pensamentos
que, desprendidos,
voam para a saudade

e se libertam no esquecimento.

LOPES, Delvanir. Epítomes, concisos e nótulas. Pará de Minas: VirtualBooks, p.13. (no prelo)