sábado, 22 de janeiro de 2022

Canticum Zachariae -Evangelium Secundum Lucam 1, 67-80

 



67. Et Zacharías pater eius replétus est Spíritu Sancto: et prophetávit dicens:

68. Benedíctus Dóminus Deus Israel, quia visitávit et fecit redemptionem plebi suae;

69. Et eréxit cornu salútis nobis: in domo David púeri sui.

70. Sicut locútus est per os sanctórum, qui a saeculo sunt, prophetárum eius:

71. Salútem ex inimícis nostris, et de manu ómnium, qui odérunt nos:

72. Ad faciéndam misericórdiam cum pátribus nostris: et memorári testaménti sui sancti.

73. Iusiurándü, quod iurávit ad Abraham patrem nostrum, datúrum se nobis:

74. Ut sine timóre, de manu inimicórum nostrórum liberáti, serviamus illi.

75. In sanctitáte, et iustítia coram ipso, ómnibus diébus nostris.

76. Et tu, puer, prophéta Altíssimi vocáberis: praeíbis enim ante fáciem Dómini paráre vias eius:

77. Ad dandam sciéntiam salútis plebi eius: in remissiónem peccatórum eórum:

78. Per víscera misericórdiae Dei nostri: in quibus visitávit nos, óriens ex alto:

79. Illumináre his, qui in tenébris, et in umbra mortis sedent: ad dirigéndos pedes nostros in viam pacis.

80. Puer autem crescébat et confortabátur spíritu: et erat in desértis usque in diem ostensiónis suæ ad Israel.


Novum Jesu Chrisi Testamentum.1912, p.144-145.


sexta-feira, 14 de janeiro de 2022

ARTE DE AMAR - Amadeu Thiago de Mello

 




Não faço poemas como quem chora,

nem faço versos como quem morre.

Quem teve esse gosto foi o bardo Bandeira

quando muito moço; achava que tinha

os dias contados pela tísica

e até se acanhava de namorar.

Faço poemas como quem faz amor.

É a mesma luta suave e desvairada

enquanto a rosa orvalhada

se vai entreabrindo devagar.

A gente nem se dá conta, até acha bom,

o imenso trabalho que amor dá para fazer.


Perdão, amor não se faz.

Quando muito, se desfaz.

Fazer amor é um dizer

(a metáfora é falaz)

de quem pretende vestir

com roupa austera a beleza

do corpo da primavera.

O verbo exato é foder.

A palavra fica nua

para todo mundo ver

o corpo amante cantando

a glória do seu poder.


De uma vez por todas, 1996

quinta-feira, 13 de janeiro de 2022

IGNOTO DEO - José Régio (José Maria dos Reis Pereira)




Desisti de saber qual é o Teu nome,

Se tens ou não tens nome que Te demos,

Ou que rosto é que toma, se algum tome,

Teu sopro tão além de quanto vemos.


Desisti de Te amar, por mais que a fome

Do Teu amor nos seja o mais que temos,

E empenhei-me em domar, nem que os não dome,

Meus, por Ti, passionais e vãos extremos.


Chamar-Te amante ou pai... grotesco engano

Que por demais tresanda a gosto humano!

Grotesco engano o dar-te forma! E enfim,


Desisti de Te achar no quer que seja,

De Te dar nome, rosto, culto, ou igreja...

– Tu é que não desistirás de mim!


In: Biografia - 1952

quarta-feira, 12 de janeiro de 2022

SÚPLICA - Miguel Torga (Adolfo Correa da Rocha)

 


SÚPLICA


Agora que o silêncio é um mar sem ondas,
E que nele posso navegar sem rumo,
Não respondas
Às urgentes perguntas
Que te fiz.
Deixa-me ser feliz
Assim,
Já tão longe de ti, como de mim.

Perde-se a vida, a desejá-la tanto.
Só soubemos sofrer, enquanto
O nosso amor
Durou.
Mas o tempo passou,
Há calmaria...
Não perturbes a paz que me foi dada.
Ouvir de novo a tua voz, seria
Matar a sede com água salgada.

CHOVE - Ana Cristina Cesar

 CHOVE


A chuva cai.
Os telhados estão molhados,
Os pingos escorrem pelas vidraças.
O céu está branco,
O tempo está novo.
A cidade lavada.
A tarde entardece,
Sem o ciciar das cigarras,
Sem o jubilar dos pássaros,

Sem o sol, sem o céu.
Chove.
A chuva chove molhada,
No teto dos guarda-chuvas.
Chove.
A chuva chove ligeira,
Nos nossos olhos e molha.
O vento venta ventado,
Nos vidros que se embalançam,
Nas plantas que se desdobram.
Chove nas praias desertas,
Chove no mar que está cinza,
Chove no asfalto negro,
Chove nos corações.
Chove em cada alma,
Em cada refúgio chove;
E quando me olhaste em mim,
Com os olhos que me seguiam,
Enquanto a chuva caía
No meu coração chovia
A chuva do teu olhar.

 .

CESAR, Ana Cristina. Chove. In: ______. Poética. São Paulo: Companhia das Letras, 2013. p. 140.

terça-feira, 11 de janeiro de 2022

NOME - Arnaldo Augusto Nora Antunes Filho

 




algo é o nome do homem
coisa é o nome do homem
homem é o nome do cara
isso é o nome da coisa
cara é o nome do rosto
fome é o nome do moço
homem é o nome do troço
osso é o nome do fóssil
corpo é o nome do morto
homem é o nome do outro


Nome. São Paulo: BMG Ariola, 1993. 1 disco compacto (44 min): digital, estéreo. M30.072.  

Sentinela - FERNANDO ROCHA BRANT/ MILTON NASCIMENTO




Morte, vela, sentinela sou

Do corpo desse meu irmão que já se vai

Revejo nessa hora tudo o que ocorreu

Memória não morrerá


Vulto negro em meu rumo vem

Mostrar a sua dor plantada nesse chão

Seu rosto brilha em reza, brilha em faca e flor

Histórias vem me contar


Longe, longe, ouço essa voz

Que o tempo não levará


Precisa gritar sua força ê irmão

Sobreviver, a morte inda não vai chegar

Se a gente na hora de unir os caminhos num só

Não fugir nem se desviar

Precisa amar sua amiga ê irmão

E relembrar que o mundo só vai se curvar

Quando o amor que em seu corpo já nasceu

Liberdade buscar na mulher que você encontrou


Morte, vela, sentinela sou

Do corpo desse meu irmão que já se foi

Revejo nessa hora tudo que aprendi

Memória não morrerá


Longe, longe, ouço essa voz

Que o tempo não vai levar

CÂNTICO XIII - Cecília Benevides de Carvalho Meireles

 


Renova-te.

Renasce em ti mesmo.

Multiplica os teus olhos, para serem mais.

Multiplica os teus braços para semeares tudo.

Destrói os olhos que tiverem visto.

Cria outros, para as visões novas.

Destrói os braços que tiverem semeado,

para se esquecerem de colher.

Sê sempre o mesmo.

Sempre outro.

Mas sempre alto.

Sempre longe. 

E dentro de tudo.


MEIRELES, Cecília. Cântico XIII. In. ______.Poesia Completa. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1997, p. 196. (vol. 4)

sábado, 29 de maio de 2021

O MORCEGO - Augusto dos Anjos


O morcego


Meia-noite. Ao meu quarto me recolho. 
Meu Deus! E este morcego! E, agora, vede: 
Na bruta ardência orgânica da sede, 
Morde-me a goela ígneo e escaldante molho. 

"Vou mandar levantar outra parede ..." 
— Digo. Ergo-me a tremer. Fecho o ferrolho 
E olho o teto. E vejo-o ainda, igual a um olho, 
Circularmente sobre a minha rede! 

Pego de um pau. Esforços faço. Chego 
A tocá-lo. Minh'alma se concentra. 
Que ventre produziu tão feio parto?! 

A Consciência Humana é este morcego! 
Por mais que a gente faça, à noite, ele entra 
Imperceptivelmente em nosso quarto! 

Augusto dos Anjos
Eu e outras poesias

quarta-feira, 12 de maio de 2021

Para sempre - João da Cruz e Sousa

 



Ah! para sempre! para sempre! Agora

Não nos separaremos nem um dia...

Nunca mais, nunca mais, nesta harmonia

Das nossas almas de divina aurora.


A voz do céu pode vibrar sonora

Ou do Inferno a sinistra sinfonia,

Que num fundo de astral melancolia 

Minh'alma com a tu'alma goza e chora.


Para sempre está feito o augusto pacto!

Cegos seremos do celeste tato,

Do sonho envoltos na estrelada rede, 


E perdidas, perdidas no Infinito

As nossas almas, no clarão bendito,

Hão de enfim saciar tida esta sede ...


In: Cruz e Sousa: poesia. Rio de Janeiro: Agir, 1982, p. 92-93


 

terça-feira, 11 de maio de 2021

Desencanto - Manuel Bandeira


 

Eu faço versos como quem chora
De desalento… de desencanto…
Fecha o meu livro, se por agora
Não tens motivo nenhum de pranto. 

Meu verso é sangue. Volúpia ardente…
Tristeza esparsa… remorso vão…
Dói-me nas veias. Amargo e quente,
Cai, gota a gota, do coração.

E nestes versos de angústia rouca,
Assim dos lábios a vida corre,
Deixando um acre sabor na boca.

— Eu faço versos como quem morre.

 

(Teresópolis, 1912)


Manuel Carneiro de Sousa Bandeira Filho
In: A cinza das horas,  1917

A inconstância das coisas do mundo - GREGÓRIO DE MATOS






 Inconstância das coisas do mundo!


Nasce o Sol e não dura mais que um dia,
Depois da Luz se segue a noite escura,
Em tristes sombras morre a formosura,
Em contínuas tristezas e alegria.

Porém, se acaba o Sol, por que nascia?
Se é tão formosa a Luz, por que não dura?
Como a beleza assim se transfigura?
Como o gosto da pena assim se fia?

Mas no Sol, e na Luz falta a firmeza,
Na formosura não se dê constância,
E na alegria sinta-se a tristeza,

Começa o mundo enfim pela ignorância,
E tem qualquer dos bens por natureza.
A firmeza somente na inconstância.

domingo, 14 de março de 2021

DEATH IS NOTHING AT ALL - Henry Scott-Holland



Death is nothing at all. 

It does not count. 

I have only slipped away into the next room.

Nothing has happened. 

Everything remains exactly as it was. 

I am I, and you are you, and the old life that we lived so fondly together is untouched, unchanged.

Whatever we were to each other, that we are still. 

Call me by the old familiar name. 

Speak of me in the easy way which you always used. 

Put no difference into your tone. 

Wear no forced air of solemnity or sorrow. 

Laugh as we always laughed at the little jokes that we enjoyed together. 

Play, smile, think of me, pray for me. 

Let my name be ever the household word that it always was. 

Let it be spoken without an effort, without the ghost of a shadow upon it. 

Life means all that it ever meant. 

It is the same as it ever was. 

There is absolute and unbroken continuity. 

What is this death but a negligible accident?  

Why should I be out of mind because I am out of sight? 

I am but waiting for you, for an interval, somewhere very near, just round the corner. 

All is well. 

Nothing is hurt; nothing is lost. 

One brief moment and all will be as it was before. 

How we shall laugh at the trouble of parting when we meet again!